Procurador mantém cassação do prefeito Arnilton Nogueira e inelegibilidade de Marcus Vinicios de Novo Oriente

O Procurador Regional Eleitora substituto Alexandre Assunção e Silva,manifestou-se na tarde desta terça-feira(21) pelo recebimento e desprovimento dos recursos,de modo que a sentença de 1º grau seja mantida em todos os seus termos. Ou seja, a sentença condenou Arnilton e sua vice,socorrinha a cassação do mandato e realização de novas eleições e condenou o ex-prefeito Marcus Vinícios a oito(08) anos de inelegibilidade,juntamente com Arnilton Nogueira e sua vice Socorrinha.

Depois desse parecer,vai agora para o relator proferir o voto e colocar no plenário.

Veja a decisão a baixo:

MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL Procuradoria Regional Eleitoral do Estado do Piauí

Ação de Investigação Judicial Eleitoral nº1-28.2017.6.18.0018 – Classe 3. Protocolo: 61.160/2016.

Procedência: Novo Oriente do Piauí – PI (18ªZE/PI – Valença do Piauí).

Assunto: Ação de Investigação Judicial Eleitoral – Abuso de Poder – Eleições 2016. Recorrente(s): Marcus Vinícius Cunha Dias, prefeito de Novo Oriente, Maria do Socorro Veloso Pinto, vice-prefeita eleita de Novo Oriente, Arnilton Nogueira dos Santos, prefeito eleito de Novo Oriente.

Recorrido(s): Coligação “Compromisso, Trabalho e Realização”.

Excelentíssimo Senhor Relator,

 

  • – Relatório.

 

Cuida-se de Recursos Eleitorais interpostos por Arnilton Nogueira dos Santos, Maria do Socorro Veloso e Marcos Vinícius Cunha Dias em face da sentença que julgou procedente a presente Ação de Investigação Judicial Eleitoral – AIJE, determinando a cassação dos diplomas expedidos em favor dos investigados Arnilton Nogueria dos Santos e Maria do Socorro Veloso Pinto bem como a impondo a sanção de inelegibilidade ao investigado Marcos Vinícius Cunha Dias, pelo prazo de 08 (oito) anos.

Recursos interpostos por Arnilton Nogueira dos Santos e Maria do Socorro Veloso Pinto às fls. 276-290, e por Marcos Vinícius Cunha Dias às fls. 457-

  1. Retificação aos recursos apresentada conjuntamente pelos três recorrentes às fls. 800-821.

Nas peças recursais, os recorrentes aduzem, preliminarmente, a necessidade de suspensão do processo decorrente do extravio de documentos; a possibilidade de juntada de documentos na via recursal; a ilegitimidade superveniente da recorrida em face de sua extinção.

No mérito, alegam que operou-se a decadência do direito de ingressar com a presente AIJE, em face de defeito de representação; que a nomeação de servidores públicos ocorrida no ano de 2016 não descumpriu a legislação eleitoral; que o reajuste salarial concedido aos professores da rede pública municipal ocorreu em período permitido por lei; que não é possível decretar sanção de inelegibilidade direta em AIJE por conduta vedada.

Contrarrazões ao recurso eleitoral interposto por Arnilton Nogueira dos Santos e Maria do Socorro Veloso Pinto às fls. 691-733. Contrarrazões ao recurso eleitoral interposto por Marcos Vinícius Cunha Dias às fls. 735-778. Contrarrazões à retificação dos recursos apresentada conjuntamente pelos três recorrentes às fls. 968-1020.

Em suas contrarrazões, a recorrida consigna, em sede preliminar, sua legitimidade para ingressar com o presente feito; que não houve extravio de documentação na presente AIJE; que não cabe retificação aos recursos apresentados; que os documentos posteriormente juntados com os recursos devem ser desentranhados.

No mérito, salienta que a decadência suscitada não ocorreu porque

o defeito de representação é sanável; que o recorrente Marcus Vinícius Cunha Dias, então prefeito da cidade de Novo Oriente do Piauí, em 26 de agosto de 2016, protocolou Projeto de Lei nº04, concedendo reajuste salarial aos servidores municipais e equiparando o salário dos professores ao piso nacional; que essa prática constitui abuso de poder por conduta vedada; que o recorrente Marcus Vinícius Cunha Dias convocou, entre os dias 06 de junho de 2016 e 07 de julho de 2016, 32 (trinta e dois) concursados para assumir cargos de provimento efetivo; que nessa convocação houve desrespeito ao edital, por haver candidatos aprovados dentro das vagas que não foram chamados enquanto houve outros que estavam apenas classificados e foram convocados; que as práticas realizadas por Marcus Vinícius tinham o objetivo de favorecer o Sr. Arnilton Nogueira dos Santos, prefeito eleito.

Em síntese, é o relatório.

  1. 1. Necessidade de suspensão do processo. Extravio de documentação.

 

Os recorrentes asserem que o processo em análise encontra-se incompleto pois, segundo o teor da certidão de fl. 783, foram extraviados alguns documentos. Afirmam que não podem ter sua defesa prejudicada por ato que não deram causa. Assim, requerem a suspensão do processo até que os autos sejam completamente restaurados.

O inconformismo relatado refere-se à parte da certidão que diz “até a presente data não foram apresentadas a este Cartório Eleitoral as folhas nºs 95, 525, 526 e 527, bem como as vias originais do requerimento de juntada de substabelecimento de fls.647/648.

Entretanto, foi apresentada nova certidão à fl. 959, nos seguintes termos: “… 2. Revendo os autos e confrontando os documentos apresentados às fls.511/529 com novos documentos apresentados pelas partes investigadas/recorrentes, protocolados em 19/10/2017 sob nº 17595/2017, às fls. 837/852, constatamos erros de numeração das folhas dos presentes autos, no intervalo de 524 a 528, por equívoco de servidora deste Cartório Eleitoral; 3. Erro igualmente constatado no intervalo de 93 a 96 dos autos. …”

Do cotejo entre as duas certidões, observa-se a inexistência de extravio de documentos na presente demanda, motivo pelo qual essa preliminar deve ser afastada.

 

  1. 2. Possibilidade da juntada de documentos na via recursal.

 

Os recorrentes argumentam que o caput do art. 2661, do Código Eleitoral – CE, autoriza “à parte juntar em seu recurso simplesmente documentos que antes não havia apresentado, mas que, agora, em seu entender, é importante e/ou útil, independentemente do seu caráter de novo”.

O processo é composto por uma série de atos e procedimentos que devem ser praticados e observados numa sequência lógica e em momentos previamente estabelecidos, sob pena de preclusão.

1 Art. 266. O recurso independerá de têrmo e será interposto por petição devidamente fundamentada, dirigida ao juiz eleitoral e acompanhada, se o entender o recorrente, de novos documentos.

Acerca de produção de provas, dispõe o caput do art. 434, do Código de Processo Civil – CPC, aplicado supletiva e subsidiariamente aos processos eleitorais2, que “incumbe à parte instruir a petição inicial ou a contestação com os documentos destinados a provar suas alegações”. Mais adiante (art. 435, caput), informa que “é lícito às partes, em qualquer tempo, juntar aos autos documentos novos, quando destinados a fazer prova de fatos ocorridos depois dos articulados ou para contrapô-los aos que foram produzidos nos autos”. Admitindo-se (art. 435, parágrafo único) “a juntada posterior de documentos formados após a petição inicial ou a contestação, bem como dos que se tornaram conhecidos, acessíveis ou disponíveis após esses atos”.

Analisando os dispositivos citados, observa-se que a produção de provas feita fora dos marcos estabelecidos no art. 434, do CPC, é uma possibilidade excepcional e por conseguinte, somente será autorizada nas hipóteses discriminadas no art. 435 do CPC. Ademais, a expressão “novos documentos” do art. 266, do CE, deve ser interpretada à luz do CPC.

A doutrina mais abalizada ensina que “por “novos documentos” devem-se compreender aqueles: (i) indisponíveis ou inexistentes na ocasião do ajuizamento da demanda ou da apresentação da defesa, e, portanto, não poderiam ter sido apresentados naqueles momentos processuais; (ii) os que se tornaram conhecidos posteriormente à prática daqueles atos processuais (CPC/2015, art. 435, parágrafo único); (iii) os pertinentes a fato novo, ou seja, fato ocorrido depois daqueles atos processuais; (iv) os usados para contrapor documento cuja juntada aos autos foi deferida.”3

Portanto, a juntada de documentos emsede recursal reclama a apresentação de justo motivo que comprove a sua impossibilidade de fazê-lo no tempo devido, sob pena de preclusão da oportunidade de produção de prova, ante o encerramento da instrução processual. Se foi dado à parte a chance de produzir provas e requerer diligências no momento oportuno, a ela não se permite mais apresentar prova. É a ratio que se extrai dos seguintes julgados: “Não se admite, em processo de contas, juntada de novos documentos em sede recursal na hipótese de anterior intimação da parte para suprir a falha. Precedentes.” (Respe nº41418 – Goiânia/GO, Ac.

2 Art. 15. Na ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas ou administrativos, as  disposições deste Código lhes serão aplicadas supletiva e subsidiariamente.

3 GOMES, José Jairo. Recursos Eleitorais. São Paulo: Atlas, 2016. p. 75.

04/04/2017, Rel. Min.  HERMAN  BENJAMIN,  DJE, 21/11/2017); “1. Inadmitida,   em

processo de prestação de contas, a juntada de novos documentos com os embargos de declaração quando a parte tenha sido anteriormente intimada a suprir a falha. Precedentes. 2. Oportunizado ao agravante se manifestar sobre as irregularidades apontadas pela unidade técnica, e quedando-se inerte, alcançada pelo manto da preclusão a oportunidade de apresentar prestação de contas retificadora.” (AI nº162403  –  Belém/PA,  Ac.  28/03/2017,  Rela.  Min.  ROSA  WEBER,  DJE,  Tomo 72,

11/04/2017, p. 38); “A juntada de novos documentos em sede recursal não se revela possível quando o candidato, previamente intimado para sanear a falha apontada, não apresenta os documentos ou o faz de modo insatisfatório, efetivando-se a preclusão.” (Respe nº46227 – Salvador/BA, Ac. 10/11/2016, Rel. Min. Luiz Fux, DJE, Tomo 57, 23/03/2017, p. 27).

Nesse sentido, também se manifestou o Tribunal Regional Eleitoral

do Piauí – TRE-PI:

 

 

RECURSO. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES 2016. […]

– É inviável a juntada de documento que não podem ser considerados novos em sede recursal.

(AIJE nº21238 – Jacobina do Piauí/PI, Ac. 26/01/2017, Rel. Daniel Santos Rocha Sobral, DJE, Tomo 18, 01/02/2017, p. 9-10).

 

RECURSO. REPRESENTAÇÃO. ELEIÇÕES 2014. JUNTADA DE DOCUMENTOS SOMENTE EM FASE RECURSAL. IMPOSSIBILIDADE. PRECLUSÃO DA PROVA.

[…]

– Impossibilidade da juntada, em sede recursal, de documentos que poderiam ter sido apresentados na petição inicial ou na defesa. Arts. 396 e 397 do Código de Processo Civil.

(Rp nº4484 – Campo Maior/PI, Ac. 29/08/2016, Rel. Geraldo Magela e Silva Meneses, DJE, Tomo 168, 05/09/2016, p. 9).

Na espécie, os documentos adicionados aos autos, por meio de decisão prolatada nos autos da Ação Cautelar nº 0600148-59.2017.6.18.0000 (ID 12061), às fls. 1030-1037, dizem respeito a fatos que já foram discutidos no processo, razão pela qual eles não devem ser conhecidos, pois sobre a juntada dessa documentação pesa o manto da preclusão.

De fato, na instrução processual, os recorrentes tiveram a oportunidade de requerer diligências, conforme despacho de fl. 92: “Considerando que as partes não demonstraram interesse na produção de prova testemunhal, e tendo em vista a contestação apresentada pelos investigados, intimem-se as partes para, 03 (três) dias [sic], manifestarem se têm interesse na realização de diligências.” No entanto, quedaram-se inertes, consoante certidão de fl. 96.

 

  1. 3. Ilegitimidade da coligação recorrida.Os recorrentes asseveram a ocorrência de ilegitimidade superveniente da coligação para propor a presente demanda.Segundo relatam, a existência jurídica da coligação findava em 09/01/2017, em razão do prazo decadencial de 15 (quinze) dias, contados da diplomação, para ajuizar essa ação eleitoral. Ocorre que na procuração outorgada pela investigante consta a data de 01/02/2017.Não tem razão de ser essa preliminar.Compulsando os autos, observa-se que a AIJE foi ajuizada em 09/12/2016, antes mesmo da diplomação, dentro, portanto, do prazo previsto em lei. Entretanto, em que pese a ação ter sido apresentada no prazo devido, a procuração que a acompanhava padecia de erro, porquanto nela foram outorgados poderes para atuação na Justiça do Trabalho e não na Justiça Eleitoral. Ou seja, a ação foi iniciada com nítido vício de representação, o que é perfeitamente possível.

    Nessas situações, impõe-se ao juiz o dever de designar prazo para que o defeito seja sando4. E sendo corrigida a falha, a ação segue o seu curso normal. Nos termos da legislação processual, o feito somente será extinto sem

     

    4 Art. 76, caput. Verificada a incapacidade processual ou a irregularidade da representação da parte, o juiz suspenderá o processo e designará prazo razoável para que seja sanado o vício.

    julgamento do mérito se não for atendido, pelo autor, o despacho de regularização da representação processual no prazo determinado.

    Nesse ponto, a recorrida foi diligente pois providenciou a regularização da representação processual no prazo de 02 (dois) dias após sua intimação, haja vista que ela foi intimada em 01/02/2017 e corrigiu o erro em 03/02/2018, ou seja, dentro de prazo razoável. Assim, não ocorreu a decadência ventilada pelos recorrentes.

    Vale registrar que para evitar decadência, até mesmo sem procuração, será permitido ao advogado postular em juízo5, e nessas hipóteses, cujo defeito é mais grave do que o discutido nesses autos, a lei autoriza a regularização6.

    Em relação à existência jurídica da coligação, tem-se que ela nasce nas convenções partidárias, como um acordo entre partidos para disputar conjuntamente as eleições, e extingue-se, entre outros motivos, com o fim das eleições para as quais foi formada. Entretanto, por construção jurisprudencial, é conferida à coligação legitimidade para ajuizar ações eleitorais após a realização das eleições, desde que obedecido o prazo decadencial das referidas ações. Desse modo, iniciada a ação eleitoral dentro do prazo de validade da coligação, ela permanece válida até o fim do processo.

    Na espécie, os recorrentes questionam a validade da coligação tendo em vista que a procuração outorgada pela recorrida data de 01/02/2017, prazo que ultrapassa, na visão deles, o período de existência da coligação.

    Essa interpretação é equivocada.

    A análise da existência jurídica da coligação deve ser feita tendo por base a data do ajuizamento da ação e não a data da procuração que a acompanha, visto que eventual defeito na representação constitui falha sanável que pode ser corrigida no decorrer do processo.

    Ora, se a falha é corrigida, o defeito apresentado não mais existe, por conseguinte a demanda iniciada deve tramitar regularmente.

    Assim, não há que se falar em decadência da ação, nem em ilegitimidade superveniente da investigante.

    5 Art. 104, caput. O advogado não será admitido a postular em juízo sem procuração, salvo para evitar preclusão, decadência ou prescrição, ou para praticar ato considerado urgente.

    6 Art. 104, § 1o. Nas hipóteses previstas no caput, o advogado deverá, independentemente de caução, exibir a procuração no prazo de 15 (quinze) dias, prorrogável por igual período por despacho do juiz.

    1. 4. Da retificação ao recurso apresentado.

     

    A recorrida pondera que a retificação apresentada ao recurso eleitoral anteriormente aviado pelos recorrentes não é cabível; que sua interposição visa, ao arrepio da lei, trazer aos autos novos fatos e novas provas.

    Contra a decisão de 1º grau, foram apresentados simultaneamente, pelos recorrentes, embargos de declaração e recurso eleitoral. Ao decidir sobre os embargos (fls. 784-792), o magistrado negou provimento ao recurso, entretanto, retificou, de ofício, a alínea “b” do dispositivo da sentença anteriormente prolatada.

    A alteração se deu nos seguintes termos, na primeira decisão (fls. 229-238), a letra “b” do dispositivo dizia: “suspender os direitos políticos do investigado Marcos Vinícius Cunha Dias, pelo prazo de 8 (oito) anos, a contar do dia 03.10.2016 (data das eleições/2016), na forma da Lei Complementar nº135/2010”; na segunda decisão (fls. 784-792), a referida alínea passou a ter o seguinte teor: “cominar a sanção de inelegibilidade pelo prazo de 08 (oito) anos ao investigado Marcos Vinícius Cunha Dias, contados do dia 03.10.2016 (data das eleições/2016), na forma da LC nº135/2010”.

    Quanto a esse ponto, o magistrado a quo apenas adequou a sentença ao substituir a expressão “suspender os direitos políticos do investigado” pela expressão “cominar a sanção de inelegibilidade … ao investigado”, de acordo com a fundamentação externada na própria sentença (fl. 237), in verbis:

     

    “Em síntese, ao primeiro investigado Marcos Vinícius Cunha Dias, responsável pelos atos abusivos, praticados no comando da máquina administrativa, que interferiu na lisura do pleito, cabe cominar a inelegibilidade pelo prazo de 08 (oito) anos, contados a partir da eleição realizada em 03 de outubro de 2016”.

     

    Assim, essa modificação, por si só, não tinha o condão de autorizar o manejo da retificação do recurso anteriormente apresentado pois conforme leciona José Jairo Gomes7, “só se deve exigir a retificação ou a ratificação do

    7 GOMES, José Jairo. Recursos Eleitorais. São Paulo: Atlas, 2016. p. 107.

     

     

    recurso interposto quando os embargos forem acolhidos e, em razão disso, modificarem a decisão embargada; ainda assim, se a modificação for relevante”.

    Ocorre que na sentença foi determinado, também, o desentranhamento da documentação juntada com os recursos.

    Nesse ponto, em homenagem ao princípio do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, deve a parte ter oportunidade de se manifestar sobre o desentranhamento determinado, possibilitando que ela complemente ou altere suas razões.

    Nesse sentido, dispõem o art. 10, do CPC: “O juiz não pode decidir, em grau nenhum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício”; e o caput do art. 933, do CPC: “Se o relator constatar a ocorrência de fato superveniente à decisão recorrida ou a existência de questão apreciável de ofício ainda não examinada que devam ser considerados no julgamento do recurso, intimará as partes para que se manifestem no prazo de 5 (cinco) dias”.

    Assim, é cabível a retificação do recurso para acrescentar tópico referente ao desentranhamento da documentação apresentada com os recursos eleitorais interpostos pelos recorrentes.

    Vale registrar que a interposição simultânea de embargos de declaração e outro recurso eleitoral é possível no ordenamento jurídico brasileiro. Nessas hipóteses, é permitido ao embargado, caso já tenha interposto outro recurso em face da decisão objeto dos embargos declaratórios, complementar ou alterar suas razões nos limites da modificação verificada no ato decisório relativo aos aclaratórios 8.

    Na espécie, muito embora os aclaratórios não tenham sido acolhidos e a alteração realizada no dispositivo da sentença não seja relevante a ponto de modificar o teor e o sentido da decisão anteriormente proferida, a retificação se faz necessária porquanto houve a determinação de desentranhamento

    8 Art. 1024, §4o, CPC. Caso o acolhimento dos embargos de declaração implique modificação da decisão embargada, o embargado que já tiver interposto outro recurso contra a decisão originária tem o direito de complementar ou alterar suas razões, nos exatos limites da modificação, no prazo de 15 (quinze) dias, contado da intimação da decisão dos embargos de declaração.

    Art. 1024. §5o, CPC. Se os embargos de declaração forem rejeitados ou não alterarem a conclusão do julgamento anterior, o recurso interposto pela outra parte antes da publicação do julgamento dos embargos de declaração será processado e julgado independentemente de ratificação.

  2. de documentos apresentados com os recursos, assunto que deveria ser analisado e decidido apenas no juízo ad quem, pois ao juiz de piso cabia apenas remeter ao Tribunal Regional Eleitoral os recursos e a documentação recebidos9.Por fim, o tema relativo ao extravio da documentação, ínsito na certidão de fl. 783, também pode ser discutido por meio da retificação aviada, tudo com base no princípio do devido processo legal e seus consectários, haja vista que o citado documento foi juntado aos autos após a manifestação das partes.Por essas razões, a peça de retificação interposta deve ser conhecida apenas nos capítulos que tratam das preliminares III.1 (Do extravio de documentação certificado na fls. 783 e a necessidade de suspensão do processo) e

    III.2 (Do art. 266 do Código Eleitoral e o caráter dos novos documentos juntados no recurso eleitoral). Quanto aos outros temas, a análise da demanda deve recair sobre os primeiros recursos que foram apresentados separadamente pelos recorrentes.

     

    • – Mérito.

     

    Antes de adentrarmos nos fatos que ensejaram a procedência da demanda por abuso de poder, é imperioso analisar a tese levantada pelos recorrentes acerca da decadência do direito de ingressar com a presenta AIJE.

    Os recorrentes registram que ocorreu a consumação da decadência tendo em vista que a procuração da recorrida só foi juntada aos autos no dia 03/02/2017, portanto, fora do prazo decadencial de 15 (quinze) dias, contados da diplomação.

    No caso em tela, a inicial, apesar de ser tempestiva, foi ingressada com defeito de representação, vez que a procuração a ela anexada se referia a processo na Justiça do Trabalho.

    É certo que essa falha processual, por implicar em ausência de capacidade postulatória, traz consequências danosas para o autor da ação, ou seja, a extinção do processo.

     

    9 Art. 267, §6º. Findos os prazos a que se referem os parágrafos anteriores, o juiz eleitoral fará, dentro de quarenta e oito horas, subir os autos ao Tribunal Regional com a sua resposta e os documentos em que se fundar, sujeito à multa de dez por cento do salário mínimo regional por dia de retardamento, salvo se entender de reformar a sua decisão.

     

     

    Ocorre que o defeito de representação é vício sanável porquanto o juiz, ao verificar a irregularidade na representação da parte, tem o dever de designar prazo razoável para a correção do erro. Por conseguinte, a extinção do processo somente ocorre se, após o decurso do prazo ofertado pelo magistrado, o autor não regularizar sua situação.

    Por outro lado, em sendo providenciada a regularização da representação, seus efeitos regressam ao tempo daquela apresentada com erro, pois, se assim não fosse, o art. 76, do CPC, era letra morta, não tinha razão de ser.

    No caso sob questão, a peça vestibular foi ajuizada no prazo legal, em 09/12/2016, haja vista que a diplomação ocorreu em 15/12/2016. Em 03/02/2017 a recorrida providenciou sua correção, atendendo a uma determinação judicial, nesse sentido, datada de 01/02/2017. Logo, a constatação do erro e o respectivo saneamento ocorreram nos termos do art. 76, do CPC.

    Se foi obedecido o disposto no art. 76, do CPC, a discrepância entre o prazo fatal para ajuizamento do AIJE, 09/01/2017, e a data da procuração adicionada pela recorrida, 01/02/2017, não traz nenhum reflexo para a demanda sob análise, porquanto os efeitos da última procuração retroagem à data da primeira apresentada.

    Desse modo, não operou-se a decadência suscitada pelos recorrentes, vez que a AIJE foi proposta por parte legítima, no tempo oportuno.

    A Ação de Investigação Judicial Eleitoral ajuizada pela coligação recorrida visa apurar suposto abuso de poder político com reflexos econômicos realizados por Marcus Vinícius Cunha Dias, então prefeito de Novo Oriente do Piauí, para beneficiar os recorrentes Arnilton Nogueira dos Santos e Maria do Socorro Veloso.

    Em suma, a peça inaugural relata que o Sr. Marcus Vinícius, na condição de prefeito de Novo Oriente do Piauí, com o forte intuito de favorecer a candidatura do Sr. Arnilton Nogueira dos Santos, teria encaminhado ao legislativo municipal, em 26 de agosto de 2016, projeto de lei concedendo reajuste salarial aos servidores públicos municipais e equiparando o salário dos professores ao piso nacional. Além disso, elucida que o Sr. Macus Vinícius também convocou, entre os dias 06 de junho de 2016 e 07 de julho de 2016, 32 (trinta e dois) concursados para assumir cargos de provimento efetivo, sendo que houve candidatos aprovados dentro das vagas que não foram chamados enquanto outros, que estavam apenas classificados, tiveram suas convocações efetivadas.

    O abuso de poder político e econômico, caso seja provado, implica em sanções graves ao agente ou beneficiário da conduta tida por ilegal. Com efeito, nesses casos, a resposta sancionatória do sistema jurídico pode ensejar a declaração de inelegibilidade bem como a cassação do registro ou diploma.

    Para a caracterização desse ilícito, em razão da gravidade de suas sanções, há que se reconhecer na conduta realizada uma força capaz de  comprometer a sinceridade e a lisura do pleito eleitoral. Segundo ensina José Jairo Gomes10, “tem-se exigido que os eventos considerados apresentem aptidão ou potencialidade lesiva, isto é, sejam de tal magnitude ou gravidade que possam ferir a normalidade ou a legitimidade das eleições”. Nos termos do art. 22 inc. XVI da Lei Complementar nº64/90, “para a configuração do ato abusivo, não será considerada a potencialidade de o fato alterar o resultado da eleição, mas apenas a gravidade das circunstâncias que o caracterizam”.

    Assim, a procedência da AIJE, sob o viés do abuso de poder político e econômico, reclama a existência de fato capaz de influenciar no resultado das eleições.

    Compulsando aos autos, constata-se, à fl. 26, que o prefeito de Novo Oriente do Piauí à época das eleições de 2016 editou, em 26 de agosto de 2016,

    o Projeto de Lei nº04/2016, concedendo reajuste salarial aos servidores municipais e equiparando o salário dos professores ao piso nacional.

    Nos termos do projeto mencionado foi concedido o reajuste de 6,5% (seis vírgula cinco por cento) para os servidores que recebem acima de R$ 788,00 (setecentos e oitenta e oito reais) e de 11,57% (onze vírgula cinquenta e sete por cento) aos que recebem até esse montante. Ademais, houve equiparação do salário dos professores ao piso nacional que era de R$ 2.135,64 (dois mil, cento e trinta e cinco reais e sessenta e quatro centavos), correspondendo a um reajuste de 11,36% (onze vírgula trinta e seis por cento).

    A Lei das Eleições, ao estabelecer as condutas vedadas em campanhas eleitorais, assinala no art. 73, VIII, que é defeso ao agente público “fazer, na circunscrição do pleito, revisão geral da remuneração dos servidores públicos que exceda

    10 GOMES, José Jairo. Direito Eleitoral. 12 ed. São Paulo: Atlas, 2016. p. 787.

     

     

    a recomposição da perda de seu poder aquisitivo ao longo do ano da eleição”, a partir da data prevista para a realização das convenções partidárias até a posse dos eleitos.

    Vale lembrar que as condutas vedadas constituem espécie do gênero abuso de poder político. Assim, muito embora elas, num primeiro momento, visem resguardar a igualdade de oportunidades entre os candidatos nos pleitos eleitorais, nada impede sua análise sob o prisma do abuso de poder, porquanto este tem um conceito indeterminado, podendo assumir diversas formas. Consequentemente, é possível que uma mesma conduta vedada possa afetar jurídicos distintos: de um lado, a igualdade de oportunidades entre os candidatos e, de outro, a normalidade e legitimidade das eleições.

    Na espécie, é incontroverso que a edição do Projeto de Lei nº04/2016 efetivou uma revisão geral da remuneração dos servidores público de Novo Oriente do Piauí.

    É certo que, em anos eleitorais, o reajuste da remuneração dos servidores é possível, desde que obedeça os seguintes parâmetros: primeiro, que não ocorra na circunscrição do pleito; segundo, que não represente aumento real na remuneração dos servidores.

    Nenhum desses dois fatores foi observado com a edição do projeto de lei em questão. Com efeito, o aumento foi autorizado pelo prefeito em ano de eleição municipal e não se limitou a recompor o poder aquisitivo dos salários dos servidores municipais, porquanto a inflação oficial de 2016, segundo o IBGE, foi de 6,29% (seis vírgula vinte e nove por cento), portanto, abaixo do aumento dado pela norma municipal.

    Além disso, o projeto de lei, que só foi apresentado em 26 de agosto de 2016 e aprovado em 12 de setembro de 2016 (fls. 27-28), ou seja, no período eleitoral, teve os seus efeitos retroativos a 1º de janeiro do ano das eleições.

    Desse modo, a atitude perpetrada por Marcus Vinícios, prefeito de Novo Oriente à época dos fatos, além de configurar conduta vedada, constitui abuso de poder político.

    Com efeito, o aumento autorizado, à luz das circunstâncias do caso, é fato que se encaixa no conceito de gravidade das circunstâncias a que alude o art. 22, XVI, da LC nº64/90, tendo o condão de macular a lisura da disputa eleitoral.

    Não há dúvida que o reajuste concedido aos servidores municipais, pelo prefeito, em período próximo às eleições, configura inequívoca vantagem de seu grupo político na disputa eleitoral. De fato, o incremento salarial implementado aos servidores evidencia a utilização da máquina pública em prol dos candidatos apoiados pelo Sr. Marcus Vinícius, a saber: Arnilton Nogueira dos Santos e Maria do Socorro Veloso Pinto.

    A presente demanda também se escora no fato do Sr. Macus Vinícius ter convocado para provimento de cargos do quadro permanente de pessoal da Administração Municipal número expressivo de servidores, 32 (trinta e dois), em período próximo da realização das eleições.

    Conforme consta nos autos, o então prefeito, apoiador da candidatura de Arnilton Nogueira dos Santos e Maria do Socorro Veloso, nos meses de junho e julho de 2016, convocou diversos candidatos aprovados em concurso realizado em 2014 e homologado em 2015.

    Sobre nomeação de servidores públicos em ano eleitoral, dispõe o art. 73, V, “c”, da Lei das Eleições, que, em regra, é defeso aos agentes públicos nomear servidor aprovado em concurso público nos três meses que antecedem o pleito até a posse dos eleitos, sob pena de nulidade. Entretanto, a própria lei ressalva a nomeação de aprovados em concursos públicos homologados até o início desse prazo.

    No caso em tela, à primeira vista, as nomeações determinadas têm toda a aparência de ato lícito, uma vez que elas dizem respeito a concurso homologado em 2015. No entanto, quando se analisa o contexto em que se deram as convocações, observa-se que elas foram feitas tendo em mira as eleições de outubro de 2016, ou seja, com desvio de finalidade. Segundo o Tribunal Superior Eleitoral, “Caracteriza-se o abuso de poder quando demonstrado que o ato da Administração, aparentemente regular e benéfico à população, teve como objetivo imediato o favorecimento de algum candidato” (Respe nº 25074 – Tucunduva – RS, Ac. nº 25074 de 20/09/2005, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ, 28/10/2005, p. 136).

    Com efeito, apesar de o concurso ter sido homologado no começo de 2015, não há nos autos prova de que antes de junho de 2016, ou seja, período próximo à eleição, tenha havido alguma nomeação para provimento de cargo efetivo no referido município. Isso reforça a ideia de que o chamamento para ingresso no serviço público ocorrera com o exclusivo interesse de beneficiar os candidatos do grupo político do Sr. Marcus Vinícius, em detrimento de seus concorrentes.

     

     

    Ademais, palmilhando os autos, nota-se que houve nomeações de pessoas que não estavam dentro do número de vagas inicialmente ofertadas no concurso, enquanto outras, que lograram tal feito, não foram agraciadas com a convocação. Esse fato, que de início parece não ter relação com a eleição, na realidade, robustece a tese da indevida interferência do poder político no ato de admissão de pessoal no serviço público porquanto, conforme certidão de fl. 101, o critério utilizado para determinar os nomeados seria o domicílio eleitoral do futuro servidor.

    Portanto, também no caso das nomeações efetivadas, está patente a intenção do Sr. Marcus Vinícius em obter proveito eleitoral, em evidenciar os seus candidatos, enfim, em desvirtuar o uso da máquina administrativa, colocar ela a serviço de seus correligionários.

  3. Vale registrar que a procedência do pedido deduzido na AIJE implica em sanção tanto para quem seja o responsável como para quem seja beneficiário do ato tido por abusivo. Nesse sentido:EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RECURSO ORDINÁRIO. ELEIÇÕES 2014. GOVERNADOR E VICE-GOVERNADOR. CONDUTA VEDADA. ART. 73, VI, B, DA LEI 9.504/97. PUBLICIDADE INSTITUCIONAL EM PERÍODO VEDADO. ILÍCITO DE CARÁTER OBJETIVO. MULTA. BENEFICIÁRIO. INCIDÊNCIA. […]
    1. Em julgamento unânime, esta Corte Superior proveu parcialmente recurso ordinário em Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) […]
    2. Para incidência da sanção, não se exige que a conduta tenha sido praticada diretamente por partidos políticos, coligações e candidatos, bastando que qualquer um deles figure como beneficiário, nos termos do art. 73, § 8º, da Lei 9.504/97 e de precedentes desta Corte.

    (RO – Embargos de Declaração em Recurso Ordinário nº 378375

    – RIO DE JANEIRO – RJ, Ac. de 27/09/2016, Rel. Min. Antonio Herman de Vasconcellos e Benjamin, DJE, Tomo 199, 17/10/2016, p. 36-37)

     

    Na espécie, os ilícitos eleitorais praticados por Marcus Vinícius beneficiaram diretamente as candidaturas de Arnilton Nogueira dos Santos e Maria do Socorro Veloso Pinto. Desse modo, por serem beneficiários da referida prática abusiva, devem ter os seus diplomas cassados.

    Por fim, obtempera o recorrente Marcus Vinícius que a sanção de inelegibilidade a ele imposta constitui erro material pois, no seu entender, em ação de investigação eleitoral judicial por conduta vedada não cabe aplicação direta da sanção de inelegibilidade.

    Para melhor percepção do tema, transcrevo o magistério de José Jairo Gomes, que ao tratar de AIJE, expôs:

     

    “Dois são os resultados objetivados com a ação em exame. O primeiro diz respeito à decretação da inelegibilidade do “representado e de quantos hajam contribuído para a prática do ato” (LC no 64/90, art. 22, XIV). Trata-se de provimento constitutivo positivo, em que a constituição de inelegibilidade figura como objeto imediato da demanda. Após reconhecer e declarar a ocorrência do evento abusivo, a decisão judicial constitui ou erige nova situação jurídica, consistente na inelegibilidade … Quanto à sua natureza, a inelegibilidade de que se cogita é do tipo sanção ou cominada, pois decorre da responsabilização pela prática de ilícito comprometedor da higidez do processo eleitoral. Saliente-se que a sanção em apreço pode ser imposta ainda que a lide seja julgada depois das eleições ou mesmo da diplomação11.

     

    Desse modo, a sanção de inelegibilidade é sanção que decorre diretamente da condenação em Ação de Investigação Judicial Eleitoral.

     

    • – Conclusão.

    11 GOMES, José Jairo. Direito Eleitoral. 12 ed. São Paulo: Atlas, 2016. p. 662.

     

     

     

    À luz do exposto, o Ministério Público Eleitoral, em sede preliminar, manifesta-se pela impossibilidade de juntada dos documentos trazidos com os recursos interpostos bem assim pelo conhecimento da retificação interposta (fls.800-821) apenas nos capítulos que tratam das preliminares III.1 (Do extravio de documentação certificado na fls. 783 e a necessidade de suspensão do processo) e

    III.2 (Do art. 266 do Código Eleitoral e o caráter dos novos documentos juntados no recurso eleitoral). As demais preliminares devem ser afastadas.

    No mérito, o Ministério Público Eleitoral manifesta-se pelo recebimento e desprovimento dos recursos, de modo que a sentença de 1º grau seja mantida em todos os seus termos.

  4. Teresina, 21 de fevereiro de 2018. 

     

    Alexandre Assunção e Silva

    Procurador Regional Eleitoral Substituto


     

     

 

 

 

 


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