Bloco petrolífero no sul da Bahia vai a leilão hoje sob disputa ambiental e judicial

Áreas próximas ao Parque Nacional de Abrolhos são ofertadas pelo governo apesar de parecer técnico contrário do Ibama e pressão de ambientalistas; após ação do MPF, licitação acontece sub judice
O arquipélago de Abrolhos, que concentra a maior biodiversidade do Atlântico Sul Foto: MARCO ANTÔNIO TEIXEIRA / WWF / Agência O Globo

RIO E CARAVELAS (BA) — A Agência Nacional de Petróleo (ANP) vai ofertar hoje, em sua 16ª rodada de licitação de campos de petróleo, sete blocos que se tornaram alvo de uma campanha de ambientalistas e de uma ação do Ministério Público Federal (MPF) por estarem próximos ao Parque Nacional Marinho dos Abrolhos, no sul da Bahia. O risco de desastre ambiental não é, no entanto, unanimidade entre os especialistas.

Um parecer técnico do Ibama foi contrário à inclusão dos blocos no leilão, por conta dos impactos “físicos, biológicos e socioambientais” em caso de acidente com vazamento, que poderia atingir “todo litoral sul da Bahia e a costa do Espírito Santo, incluindo todo o complexo recifal do Banco de Abrolhos”.

Esse documento embasou uma ação do MPF-BA pedindo a retirada dessas áreas do leilão, mas uma indefinição judicial fez com que elas continuassem sendo ofertadas. A ANP foi obrigada pela Justiça, no entanto, a informar aos potenciais interessados que as áreas estão “sob o crivo do Poder Judiciário”.

As áreas ofertadas ficam nas bacias de Camamu-Almada e de Jacuípe, ambas no litoral baiano —a primeira delas, a cerca de 300km de Abrolhos, região com a maior biodiversidade do Atlântico Sul e berçário de espécies como a baleia jubarte.

Ecossistema ameaçado
Campos de petróleo na bacia Camamu-Almada ficam a cerca de 300 km do Parque Nacional Marinho de Abrolhos
Unidades de Conservação
(MMA, 2019)
Proteção Integral
Uso Sustentável
Bacia
Jacuípe
Atobás
 
Milhares dessas aves constroem seus ninhais em três das cinco ilhas do arquipélago
Campos de petróleo
Região do
Campo de
Manati
Campos de
pretróleo da
Bacia Camamu
Almada serão
leiloados
BAHIA
130 km
Banco Royal
Charlotte
MINAS
GERAIS
Baleias jubarte
 
Cerca de 17 mil animais acasalam e procriam na região anualmente (jul. a nov.), vindos da Antártida
300 km
Parque Nacional
Marinho de
Abrolhos
Banco de
Abrolhos
ESPÍRITO
SANTO
Corais
 
Abrolhos concentra a maior quantidade deles no Atlântico Sul, incluindo o endêmico coral-cérebro
Fonte: WWF

A agência responsável pela licitação afirma que “os blocos a serem ofertados são áreas de interesse para a ampliação do conhecimento geológico das bacias brasileiras, assim como para a geração de renda para a região e para o país”. Argumenta também que “qualquer atividade a ser realizada pelos concessionários nos blocos licitados precisa de licenciamento ambiental prévio”, que fica a cargo do Ibama.

Ambientalistas se preocupam, no entanto, com a perda de autonomia que a autarquia, subordinada ao Ministério do Meio Ambiente, vem sofrendo no governo Bolsonaro. A manutenção dos blocos no leilão mesmo contrariando parecer da área técnica —por determinação do presidente do Ibama, Eduardo Bim— seria um exemplo disso.

Petições populares

Ontem, seis organizações não governamentais que formaram a Conexão Abrolhos entregaram ao Congresso e ao MPF três petições que reuniam 1,1 milhão de assinaturas contra a inclusão dos blocos no leilão.

Mas, apesar da polêmica, o geólogo Pedro Zalán, consultor da Zag Consultoria em Exploração de Petróleo, diz que os blocos de Camamu-Almada e Jacuípe estão muito longe de Abrolhos. Ele classifica como “absurda” a informação de que as atividades nessas bacias poderiam afetar o arquipélago.

— Basta olhar no mapa. Camamu-Almada está perto de Salvador. Além disso, está em águas ultraprofundas a mais de 100 quilômetros de distância do litoral. É uma falácia falar em impacto a Abrolhos. Os ambientalistas querem impedir a exploração de petróleo — disse Zalán.

O biólogo Guilherme Dutra, diretor de Estratégia Costeira e Marinha da ONG Conservation International, lembra que o risco para o parque nacional já havia sido determinado em um leilão anterior, de 2012, pela própria empresa que levou os blocos ofertados então —ela acabou não encontrando nem óleo nem gás neles.

— O risco que blocos da bacia Camamu-Almada representam para a região dos Abrolhos foram apresentados pelo próprio setor de óleo e gás. O Estudo de Impacto Ambiental apresentado pela empresa BP Energy do Brasil ao Ibama mostra claramente que um vazamento de maiores proporções, em um bloco muito próximo dos que estão sendo oferecidos, teria probabilidade de 97% de chegar ao Banco de Abrolhos em um período mínimo de 4,3 dias.

Apesar de a ANP afirmar que “exige que as empresas possuam um sistema de gestão voltado para a prevenção de incidentes”, Dutra lembra que a complexidade geográfica da região —onde estão ainda dois imensos manguezais que são reservas extrativistas— dificulta a luta contra um eventual vazamento.

—A tragédia da chegada de óleo nas praias do Nordeste nestas últimas semanas mostra como o Brasil está mal preparado e é lento para reagir a um acidente de maiores proporções — diz Dutra.

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